Estreias da semana nos cinemas 4032l

Entre dois mundos 1x5315
Adoro demais a atriz Juliette Binoche, que aparece em tudo quanto é filme ultimamente, já vencedora do Oscar, Bafta, Berlim, Cannes e Veneza. ‘Entre dois mundos’, de 2021, estreia com certo atraso nos cinemas brasileiros, mas não deixem de ver, pois a estrela sa irradia em cada aparição em cena – ela aqui foi indicada como melhor atriz ao César, o Oscar francês, e o drama foi exibido em Cannes e premiado em San Sebastián. É uma livre adaptação do livro autobiográfico da jornalista sa Florence Aubenas, ‘Le quai de Ouistreham’ (literalmente ‘Os cais de Ouistreham’, comuna sa onde se a a história, mas publicado no Brasil como ‘A faxineira’), em que a autora se infiltrou no mundo das faxineiras para narrar a dura e humilhante jornada delas. No filme Juliette interpreta a jornalista parisiense que, para escrever um ensaio sobre essas mulheres, disfarça-se como empregada e busca trabalho de limpeza nas luxuosas balsas da Normandia. Ela é contratada e ar a encenar uma vida dupla, sem ninguém saber da ‘clandestinidade’ adotada. Ela trabalha dia e noite como faxineira, recebendo parco salário, e nos momentos de folga ou no descanso em casa faz anotações em cadernos e no laptop para o livro. Aos poucos, ela fica próxima de duas colegas de trabalho, faxineiras que enfrentam sérios problemas familiares, e juntas compartilham suas angústias - mas nunca ela revela a verdadeira identidade. Juliette está desglamourizada, sem maquiagem, num papel duplo convincente, digno de aplausos, que abre discussões em torno da uberização/precarização dos trabalhos, a exploração do trabalho feminino e o alto índice de desemprego na França desde 2010, período em que transcorre a trama. O filme marcou o retorno do diretor Emmanuel Carrère, 13 anos depois do único longa feito até então, ‘Amor suspeito’ (2008) – ele escreveu o roteiro, adaptando-o do livro de Florence, e é mais visto trabalhando como escritor e roteirista do que como diretor. Em exibição nos cinemas pela Pandora Filmes.
Teleférico do amor
Com uma carreira de 35 anos no cinema, onde realizou 16 curtas e oito longas-metragens, o diretor alemão Veit Helmer, do bem humorado ‘De quem é o sutiã’ (2018), lança uma nova comédia espirituosa, que tem um estilo próprio. ‘Teleférico do amor’ (2023) chega aos cinemas brasileiros, com distribuição da Pandora Filmes, uma fita sem diálogos, contendo uma trilhazinha leve de fundo e uma história literalmente de idas e vindas, de duas mulheres que trabalham como operadoras de teleférico e se encontram, de longe, a cada meia hora, enquanto uma cabine sobe e a outra desce. Os veículos pegam ageiros de um vilarejo no alto da montanha e os leva para uma cidadezinha no vale, e vice-versa, e enquanto os equipamentos fazem a viagem, elas trocam olhares, fazem caretas e brincadeiras. Algo ali nasce entre as duas, até que se encontram rapidamente na troca de turno. Amizade? Romance? Entre elas surge algo que extrapola os limites do trabalho. Helmer é um diretor que realiza filmes com enquadramentos estilosos e sabe usar bem a cor no cinema. Mais uma vez faz um bom filme experimental, com cortes repletos de criatividade e pitadas de excentricidade, com uma fotografia primorosa, da georgiana Goga Devdariani, cheio de paletas de cores e um registro preciso de paisagens deslumbrantes. Um filme amoroso, feminino e com graça, produção rodada no verão da Alemanha e nas montanhas da Georgia, numa região próxima ao Azerbaijão.
A procura de Martina
Estreia nos cinemas essa emocionante produção brasileira rodada no Rio de Janeiro e em Buenos Aires, com parte do elenco argentino, como a protagonista, a grande atriz veterana Mercedes Morán, de ‘O pântano’ (2001) e ‘Neruda’ (2016), e participação das ótimas atrizes brasileiras Carla Ribas e Luciana Paes. E dirigida por uma brasileira que aqui faz sua estreia em longa-metragem, Márcia Faria, realizadora de curtas e seriados, já indicada em Cannes. A ambientação do drama recorre a velhos fantasmas da Argentina, o período cruel da Ditadura Militar, e foca na luta das ‘Avós da Praça de Maio’, associação de direitos humanos argentina, fundada em 1977, que busca crianças e jovens sequestrados durante a horror daquele período de exceção. O filme acompanha uma dessas avós, Martina (Mercedes Morán), viúva que está com Alzheimer e há 30 anos busca resposta sobre o desaparecimento do neto, nascido em cativeiro durante a ditadura militar. Com crises de angústia, lembrando do ado e com momentos de devaneios e alucinação por causa da doença, encontra-se com um grupo de mulheres que estão na mesma luta – até que chega uma pista de que o neto possa estar vivo no Brasil, o que a faz seguir uma nova jornada ao país vizinho. Morán nos entrega uma performance arrebatadora, que representa bem a luta por justiça de mulheres que tiveram filhos, maridos e netos mortos pelo terrorismo de Estado cometido na pior das ditaduras da América do Sul – tanto as associações ‘Mães da Praça de Maio’ quanto ‘Avós da Praça de Maio’ calculam 30 mil desaparecidos entre na ditadura ocorrida entre 1976 e 1983. Um drama emocionante, bonito, corajoso e representativo, vencedor dos prêmios de Melhor Filme no Festival Mar de Plata (Argentina) e no Festival de Cinema do Uruguai, por voto popular. Produzido pela Kromaki e Ipanema Filmes, está nos cinemas brasileiros, distribuído pela Bretz Filmes.
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